quarta-feira, 15 de maio de 2013
Naquelas alturas ela já possuía um olhar desprendido de qualquer ilusão que durasse mais que cinco minutos. Caminhava na contramão do trânsito, empurrava o vento com as mãos e sentia um leve arrepiar que lhe cobria o corpo e a alma.
A cidade lhe parecia excitante demais e cruel demais. Queria sentir o gosto do café matinal novamente, mas ela não gostava tanto de café assim; ela gostava de sentir o seu cheiro, mais do que o seu gosto. Ela o bebia para se sentir acolhida, desperta, viva.
Seus passos tortos e ligeiros desejavam alcançar algo que ela não sabia muito bem o que era. No rosto um semblante excêntrico e uma gota de lágrima que já fazia parte do seu corpo, como uma cicatriz.
De repente um leve sorriso surgiu em seu rosto, ao acaso, meio improvisado. Caminhar era sua atividade preferida e ela se sentia feliz ao fazê-lo.
O dia estava quente, mas ela sentia frio. Em suas costas se apoiava um xale de aspecto envelhecido e cheiro de guardado. O sol sorria um sorriso indecente de alguém que pedia um pouco de atenção, mas ninguém lhe dirigia o olhar, ninguém o percebia do modo como ele queria ser percebido. As pessoas se incomodavam com ele e continuavam a caminhar, apressadamente.
O sol ardia, mas ventava. Ventava forte e seu xale se descuidou de seu corpo. Ela abaixou-se para apanhá-lo, cobriu-se novamente com o xale.
O vento arrastou os restos deixados pelos outros ao chão. O descuido descartado formava um coro colorido pelos ares e incomodava os transeuntes. Os restos incomodavam os olhos das pessoas e gritavam reclamando por um pouco de atenção, mas ninguém os encarava integralmente, apenas reclamavam tentando se livrar do incômodo.
O dia escancarava o seu desejo de ser cuidado, percebido por um olhar sensível, mas o que ele recolhia eram os mesmos passos medíocres que lhe regavam as horas.
Foi então que ela resolveu atravessar a rua e caminhar na praça. Havia folhas ao chão, secas. Ela adora caminhar sobre folhas secas. Ela tirou os sapatos que lhe apertavam os pés desajeitados e caminhou sobre as folhas que recebiam o calor dos últimos raios do sol.
Talvez ela estivesse acolhendo o dia naquele momento, talvez ele estivesse se comunicando com o sol, com o vento, do modo como eles desejavam. Ela não sabia dizer. Mas sentiu uma estúpida alegria que não lhe estampava o rosto, mas lhe aquecia o coração.
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